A água, nos seus diversos estados, está sempre em movimento, em um processo complexo conhecido como ciclo da água. O aquecimento global já está tendo um efeito mensurável sobre este ciclo, alterando a quantidade, distribuição, tempo de retorno e qualidade da água disponível. Esse post é dedicado a comentar quais são as influências das mudanças climáticas global sobre o ciclo da água, afinal, todos os processos como conhecemos hoje, sejam eles relativos ao abastecimento de comunidades, processos industriais e o funcionamento dos ecossistemas dependem direta ou indiretamente desse precioso ciclo.
Para compreender o problema da escassez de água doce, invariavelmente temos que entender a distribuição da água no planeta. Aproximadamente 98% da nossa água é salgada e apenas 2% é doce. Desse 2%, quase 70% são neve e gelo, 30% são águas subterrâneas, menos de 0,5% são águas superficiais (lagos, rios, etc.) e menos de 0,05% está na atmosfera. As mudanças climáticas têm vários efeitos nessas proporções em escala global. O principal é que o aquecimento faz com que o gelo polar derreta, o que transforma água doce em água do mar, embora isso tenha pouco efeito direto sobre o abastecimento de água.
Outro efeito do aquecimento é que a quantidade de água que a atmosfera pode armazenar aumenta proporcionalmente a sua temperatura. Esse fato pode levar a chuvas mais fortes quando o ar esfria. Embora possamos pensar que mais chuvas possam aumentar os recursos de água doce, chuvas mais intensas levam a um movimento mais rápido da água da atmosfera de volta aos oceanos, reduzindo nossa capacidade de armazená-la e usá-la. Esse efeito aumenta a velocidade do escoamento superficial, dificultando a infiltração e percolação da água no solo e por consequência, reduzindo as reservas subterrâneas.
Na região subtropical, na qual insere-se a região sul do Brasil, as mudanças climáticas provavelmente levarão a uma redução das chuvas nas regiões já secas. O efeito global é uma intensificação do ciclo da água que causa mais inundações e secas extremas em todo o mundo.
Pouco se sabe sobre a velocidade de declínio dos recursos de águas subterrâneas por causa da falta de pesquisa sobre este tema, mesmo que cerca de 50% do abastecimento mundial de água doméstica provenha desses mananciais. Embora os cientistas estejam progredindo na redução da incerteza sobre a escassez de água doce, esses tipos de incógnitas significam que as estratégias de abastecimento de água devem ser adaptáveispara que possam ser efetivas em diferentes cenários. Portanto, as preocupações com as mudanças climáticas devem ser analisadas conjuntamente à gestão da demanda de água e à gestão da sua poluição.
A queda da qualidade da água é outra consequência da mudança climática. A temperatura da água, por exemplo, geralmente se eleva em rios e lagos à medida que a temperatura do ar aumenta. Isso tende a reduzir os níveis de oxigênio dissolvido na água, o que aumenta o estresse sobre os peixes, insetos, crustáceos e outros animais aquáticos que dependem do oxigênio para sobreviver. Ainda, com o aumento do escoamento devido à precipitação mais intensa, podemos esperar que mais poluição seja lavada em direção às vias navegáveis: sedimentos, nitrogênio da agricultura, patógenos de doenças, pesticidas e herbicidas.
Com intuito de reduzir o estresse hídrico, existem fortes movimentos ao redor do mundo no sentido de tratar e reutilizar a água residuária. Afinal, por que não tratar o esgoto para reutilizar para fins menos nobres, deixando de despejá-los nos rios e aumentando a vida útil das reservas doces para que possam ser apenas destinadas a usos nobres como o abastecimento da população?
Entendendo o esgoto doméstico: O esgoto doméstico é composto por aproximadamente 99,9% de água
e apenas 0,1% de partículas sólidas e micro-organismos, mesmo assim capazes de torná-lo
repugnante ao homem. Visto da importância deste bem tão valioso à humanidade, é
essencial encontrar formas de recuperar a água dos esgotos por meio de técnicas
cada vez mais seguras de tratamento. O gerenciamento dos ciclos internos da água,
em que suas características são alteradas pelo homem, torna-se primordial para a
manutenção da qualidade da água desejada em função dos seus diversos usos.
A carga de nutrientes presentes nos esgotos domésticos contribui
diretamente para a eutrofização dos corpos receptores, levando a problemas de odor,
turbidez e baixo nível de oxigênio dissolvido, que pode muitas vezes causar a mortandade
da biota aquática. Mesmo depois de tratados, os efluentes ainda causam impacto ao
ambiente, diminuindo gradativamente a disponibilidade de água de diluição dos corpos
receptores e consequentemente seu limite de autodepuração. Por este motivo, existe
uma tendência mundial em elevar os padrões de emissão do efluente tratado, tornando
as legislações ambientais mais restritivas e incentivando as práticas de reúso condizentes
com determinadas finalidades.
O reúso já é uma prática bem desenvolvida e estabelecida em muitas
partes do mundo, destacando-se nos estados da Califórnia e Flórida nos Estados Unidos,
na Austrália e no Oriente Médio. No Brasil, principalmente nos grandes aglomerados
urbanos, a escassez de água vem se tornando uma realidade e a água de reúso, proveniente
dos esgotos domésticos devidamente tratados, aparece como uma provável solução.
O grande entrave para a consolidação desta prática é a ausência de leis e normas
nacionais que deem suporte e rejam com confiabilidade os projetos nessa área. Apesar disso, a prática já é presente no país, tendo
o exemplo do promissor projeto Aquapolo, construído para abastecer com água de reúso
as indústrias da região do ABC paulistano.
Visita da autora ao primeiro sistema de reúso de água em escala municipal em operação desde 1977, localizado na costa oeste da Flórida (Estados Unidos). |
Além dos crescentes esforços para a reutilização e reciclagem da água, a solução mais comum para auxiliar no aumento da disponibilidade hídrica com intuito de integrar as opções que abrangem a adaptação aos possíveis impactos das mudanças climáticas, é a redistribuição da água doce sobre o espaço e o tempo de forma mais controlada, devendo-se aumentar o número de reservatórios para armazenar grandes volumes de água por mais tempo. Cada vez mais, o investimento contínuo em educação e pesquisa será essencial para fornecer o conhecimento, as habilidades e a tecnologia necessárias para combater a escassez de água doce no futuro, como por exemplo, o desenvolvimento de técnicas com custo-benefício aceitável para a dessalinização com intuito de recuperar água doce dos oceanos.
REFERÊNCIAS:
https://www.theguardian.com/environment/2012/nov/30/climate-change-water
http://www.ucsusa.org/global-warming/science-and-impacts/impacts/water-and-climate-change.html#.WiW8L7pFyF0
https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/125054
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